sábado, abril 07, 2007

Livro de Horas

A Máscara de Ivone Ralha

Aqui, diante de mim,
Eu, pecador, me confesso
De ser assim como sou.
Me confesso o bom e o mau
Que vão ao leme da nau
Nesta deriva em que vou.


Me confesso
Possesso
Das virtudes teologais,
Que são três,
E dos pecados mortais,
Que são sete,
Quando a terra não repete
Que são mais.


Me confesso
O dono das minhas horas.
O das facadas cegas e raivosas
E o das ternuras lúcidas e mansas.
E de ser de qualquer modo
Andanças
Do mesmo todo.


Me confesso de ser charco
E luar de charco, à mistura.
De ser a corda do arco
Que atira setas acima
E abaixo da minha altura.


Me confesso de ser tudo
Que possa nascer em mim.
De ter raízes no chão
Desta minha condição.
Me confesso de Abel e de Caim.


Me confesso de ser Homem.
De ser um anjo caído
Do tal céu que Deus governa;
De ser um monstro saído
Do buraco mais fundo da caverna.


Me confesso de ser eu.
Eu, tal e qual como vim
Para dizer que sou eu
Aqui, diante de mim!


Miguel Torga - poeta português

11 comentários:

Escorpiana Explosiva disse...

SE EU NÃO ESTIVER ENGANADA ASSISTI UM FILME COM O NOME BEM PARECIDO E ADOREI ASSIM COMO GOSTEI DA POESIA.
DESEJO BOA PÁSCOA BJO

Muadiê Maria disse...

...e como cansa, e como pesa.

Elsa Sequeira disse...

Olá!
È forte mesmo!
SÊ ti também forte!!! Sempre!

bj

Luís Galego disse...

Me confesso de ser eu.
Eu, tal e qual como vim
Para dizer que sou eu
Aqui, diante de mim!

lindo este poema de Torga....

delusions disse...

Adoro esse poema do Torga... Sempre gostei muito desse poeta. Boa escolha esse poema é um dos mais poderosos e intensos que conheço... Também gosto muito do "Dies Irae" que é o outro poema dele que mais gosto. Aconselho-te se não conheceres...

Bjinho* boa semana

cm disse...

A descoberta do "EU".
Grande poema de Miguel Torga
Gostei de passar cá...

Cristiano Contreiras disse...

Confessa todos os sentires, aqui expostos, de cá eu admiro sua intimidade.

Aline Ribeiro disse...

Eu tb confesso, sou culpada! \o
hehehe...
Bjm querido, as palavras do teu blog servem de bálsamo pra minha vida

Muadiê Maria disse...

Nelson, tudo bem?
Eu acho que o nome deste poema é Livro de Horas e não de Honras.
Um abraço,
Martha

Paula Negrão disse...

aaah, eu adoro vir aqui! =]

beijoo

*e tive uma boa páscoa sim!

Vera Carvalho disse...

Confesso que só uma alma de poeta pode compilar uma poesia assim!