quinta-feira, novembro 23, 2006

Makèzú*

Pintura de Malangatana



– "Kuakié(1)!!!... Makèzú, Makèzú..."
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O pregão da avó Ximinha
É mesmo como os seus panos,
Já não tem a cor berrante
Que tinha nos outros anos.

Avó Xima está velhinha,
Mas de manhã, manhãzinha,
Pede licença ao reumâtico
E num passo nada prático
Rasga estradinhas na areia...

Lá vai para um cajueiro
Que se levanta altaneiro
No cruzeiro dos caminhos
Das gentes que vão pr'a Baixa.

Nem criados, nem pedreiros
Nem alegres lavadeiras
Dessa nova geração
Das "venidas de alcatrão"
Ouvem o fraco pregão
Da velhinha quitandeira.

– "Kuakiè... Makèzú... Makèzú..."
– "Antão, véia, hoje nada?"
– "Nada, mano Filisberto...
Hoje os tempo tá mudado..."

– "Mas tá passá gente perto...
Como é aqui tás fazendo isso?"

– "Não sabe?! Todo esse povo
Pegó um costume novo
Qui diz qué civrização:
Come só pão com chouriço
Ou toma café com pão...

E diz ainda pru cima
(Hum... mbundo kène muxima(2)...)
Qui o nosso bom makèzú
É pra veios como tu".

– "Eles não sabe o que diz...
Pru qué qui vivi filiz
E tem cem ano eu e tu?"

– "É pruquê nossas raiz
Tem força do makèzú!..."


*Makezu – nozes de cola (sing. dikezu)
(1)Kuakié! – amanheceu!
(2)Mbundu kene muxima - negro não tem coração
(Palavras da Língua Kimbundu)


Viriato da Cruz – poeta luso-angolano
(poema de 1961)

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